Via da Verdade

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sábado, junho 14, 2003
 
Ficha de Leitura de W.V.Quine, Filosofia e Linguagem, org. João Sáágua, ed. Asa.

Os Cinco Marcos do Empirismo

Neste ensaio é feita uma breve apresentação dos principais progressos feitos pela filosofia empirista, na qual se filia Quine. Na verdade, apesar de se dizer empirista Quine situa-se de uma forma crítica em relação ao empirismo clássico, como ficará patente neste ensaio.

Cinco pontos face aos quais o empirismo mudou para melhor:

1 – A primeira mudança operada em epistemologia foi a de se começar a falar sobre palavras ou expressões linguísticas em vez de ideias. Esta mudança de atenção das ideias para as palavras deveu-se a que a ideia não estaria à altura dos padrões do empirismo, que diz que apenas os sentidos fazem sentido.

2 – O segundo dos cinco pontos de viragem foi a mudança dos termos (palavras) para as frases, enquanto veículo do sentido. Este veículo do sentido deixa de ser visto como sendo a palavra, mas antes a frase.
Isto quer dizer que os termos significam apenas porque contribuem para o sentido das frases que os contêm. O primeiro filósofo a atribuir primazia à semântica das frases enquanto principal factor de obtenção de sentido, foi Bentham, seguido mais tarde por Frege e Russel (que na sua teoria das Descrições Definidas nos diz que os Nomes Próprios não são mais que Descrições Definidas disfarçadas).

Como consequência da mudança de atenção dos termos para as frases, a epistemologia tornou-se, no sec. XX, uma crítica menos dos conceitos que das verdades e das crenças.
Segundo Quine, a Teoria Verificacionista do sentido (ver Ficha de Leitura do Capítulo Verificacionismo in “Philosophy of Language” de W.Lycan – inserir data) dizia, de facto, respeito ao sentido e à posse de sentido das frases e não tanto das palavras.

3 – O terceiro movimento evolutivo do empirismo muda o foco de atenção das frases para o sistema de frases.
Uma frase seria um texto demasiado curto para servir de veículo para o sentido empírico. Existem numa teoria aquilo que Quine chama de condicionais observáveis, que dizem que se certas condições observáveis se verificarem um certo acontecimento observável ocorrerá. No entanto, estes condicionais observáveis seriam implicados apenas pela teoria como um todo.
A verificar-se este holismo radical, ou seja, a ser a teoria, ou todo o sistema de frases o veículo do sentido empírico, quão inclusiva teria de ser a visão dos sistema? A totalidade da Ciência? Apenas um dos seus ramos?
Segundo Quine, devemos encarar isto como uma questão de grau.
Bocados mais modestos serão suficientes. (...) Algum carácter vago quanto ao sentido deve ser permitido, aconteça o que acontecer.
Como tal, este terceiro movimento do empirismo deve ser encarado como um holismo moderado.
Haverá frases isoladas (...) que terão o seu sentido empírico separável, pois podemos tornar uma teoria numa frase única.

4 – O quarto movimento segue de perto este holismo. O holismo esbate o suposto contraste entre a frase sintáctica, com o seu conteúdo empírico, e frase analítica, com o seu conteúdo nulo.
As próprias frases analíticas encontram-se diluídas no sistema. Mesmo as leis matemáticas e lógicas são revizíveis e fazem parte de uma rede de crenças.

5 – O quinto movimento traz-nos o naturalismo: o abandono do objectivo de uma filosofia primeira, anterior à ciência natural. – nota: aqui importa aprofundar este 5º marco e fazer a passagem para a ontologia de Quine em “Sobre o que há”

O naturalismo vê a ciência natural como uma investigação sobre a realidade, sem necessitar de qualquer outra justificação para além da observação e do método hipotético-dedutivo.

O naturalismo não repudia a epistemologia mas delega-a à psicologia empírica: A questão do conhecimento é tratada pela psicologia empírica, reportando-se à aprendizagem da linguagem e à neurologia da percepção.

O filósofo naturalista procura melhorar, clarificar e compreender o sistema a partir de dentro. Como o cientista (e aqui podemos notar alguma sombra dos paradigmas de Thomas Kuhn), herdou uma teoria do mundo em plena actividade.
Ele – o filósofo naturalista – é um marinheiro ocupado, à deriva no barco de Neurath. Ou seja, no processo do conhecimento (assim como no da significação)não é possível largarmos a nossa bagagem de conhecimentos anteriores. – nota: neste ponto devemos estabelecer a ligação com a teoria quineana da Relatividade Ontológica, segundo a qual comprometemo-nos com determinadas entidades quando optamos por determinadas teorias ontológicas.