Via da Verdade

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terça-feira, abril 05, 2005
 


Desejo

Os desejos parecem ser tanto uma fonte como um entrave à acção racional. Ao agir porque desejamos fazer algo estamos a expressar a individualidade que nos caracteriza enquanto seres humanos, mas esses mesmos desejos parecem por vezes entrar em conflito com aquilo que é racionalmente esperado de um agente moral. A discussão filosófica acerca dos desejos divide-se entre os que consideram que os desejos constituem a génese da acção e mesmo da acção moral (Spinoza, por exemplo, defendeu que consideramos bom aquilo que queremos), e os que procuram estabelecer um princípio da acção independente dos desejos (para Kant este princípio autónomo era a Vontade). Um dos objectivos da actual filosofia da mente é procurar compreender o papel que os estados mentais exercem no comportamentos humano, e no âmbito desta investigação o interesse pelo conteúdo semântico e intencional dos estados mentais como os desejos foi reavivado.
Agir racionalmente é agir intencionalmente e de acordo com os conteúdos das crenças e desejos que um agente possui. Mas o que é que é para um desejo ser acerca de alguma coisa? Um desejo é um estado com conteúdo cognitivo que determina qual o seu objecto? A sugestão behaviorista é que os estados mentais são disposições para nos comportarmos de determinada maneira, no entanto, o que os behavioristas erradamente ignoram é que são necessários outros estados interiores ao sujeito para que algo se qualifique como um desejo, nomeadamente a crença de que a acção desejada terá a consequência pretendida. O comportamento racional exige uma coordenação entre crenças e desejos.
Porém, para defendermos a posição de que desejos são razões para agir temos de reconhecer a existência de factores que determinam o objecto dos desejos, independentemente das crenças, pois ?um desejo não é uma mera disposição para agir, é uma razão para agir.? Aqui coloca-se o problema do conteúdo representacional dos desejos. Se negarmos, como Hume fez, que os desejos tenham conteúdo representacional, somos levados a identificar o objecto do desejo com o estado que conduz ao comportamento que satisfará esse desejo. Segundo esta posição um desejo não depende necessariamente de uma crença. O exemplo de que temos sono e que queremos dormir independentemente de acreditarmos que o sono é benéfico para a saúde, parece ser um bom argumento a favor de uma certa modularidade na geração dos desejos.
Uma analogia entre desejos e estados perceptivos identificaria a origem dos desejos num qualquer estado corporal ? um estado de privação ou necessidade. E identificando estas causas biológicas dos desejos encontramos o seu conteúdo semântico independente do conteúdo das crenças.