Via da Verdade

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sexta-feira, outubro 14, 2005
 
Armas, Germes e Aço ? o destino das sociedades humanas
Jared Diamond; ed. Relógio d´Água

O que fez Jared Diamond escrever este livro foi uma pertinente pergunta feita por um seu amigo neoguineense: Por que razão é que vocês, brancos, criaram tanta carga e a trouxeram para a Nova Guiné e nós, negros, tínhamos tão pouca carga nossa? Por outras palavras Diamond quer perceber as razões, ou as causas, da actual distribuição da riqueza e poder pelos diversos povos e continentes e dessa forma compreender a origem da desigualdade entre os povos e as raças.

Diamond começa por descartar algumas das explicações mais comuns, como a explicação pelas diferenças biológicas entre povos. Segundo este ponto de vista racista, uns povos seriam mais inteligentes do que outros, pelo que é natural que os mais aptos (implicitamente os mais inteligentes) dominem os menos aptos (os menos inteligentes, portanto). Diamond, que viveu muitos anos entre os povos geralmente chamados de primitivos, diz que pelo contrário, a inteligência e a desenvoltura mental é apanágio destes primitivos. De facto, basta pensar na quantidade de estímulos a que uma criança primitiva é sujeita, na quantidade de interacções que estas têm com outras crianças, adultos, animais e a natureza em seu redor, e pensar no filho obeso da nossa prima, pálido de olhar vítreo e polegares calejados de carregar nos botões da PlayStation e no comando da televisão, para compreender quem é o primitivo.

Então, pode o leitor perguntar, por que motivo é que somos nós ocidentais, bando de balofos intelectuais, quem domina o mundo e não os neoguineenses, os pigmeus africanos ou os aborígenes australianos, reconhecidos ginastas mentais?

Diamond avança com dois graus de explicação. A primeira (de 1º grau) diz-nos que a sociedade ocidental (euroasiática) é quem domina o mundo devido a ter tido a seu favor factores como as armas de fogo, as doenças infecciosas e os utensílios de aço. Esta explicação é no entanto insuficiente pois deixa por esclarecer os motivos por que foram os euroasiáticos (e não outros povos quaisquer, como os Africanos ou os nativos Americanos) a desenvolver esses factores de dominação. A explicação (de 2º grau) avançada por Diamond é que as raízes de desigualdade no mundo moderno mergulham profundamente na pré-história, em diferenças ambientais, geológicas e acasos históricos, tais como a orientação dos eixos dos diferentes continentes (Leste-Oeste na eurásia e Norte-Sul nas Américas e África) que permitiu uma mais rápida e homogénea dispersão de culturas, invenções e ideias ao longo de uma mesma latitude (na verdade as invenções e as ideias foram atrás das culturas que se propagaram a partir do Crescente Fértil). A causa remota que mais terá influenciado o surgimento dos factores de dominação da eurásia terá sido, de facto, a produção alimentar (agricultura e pastorícia), que surgiu primeiro na história da humanidade na zona do Crescente Fértil e se espalhou rapidamente ao longo do eixo paralelo (Leste-Oeste) para a Europa e Ásia, levando consigo invenções como a escrita, as técnicas militares, a organização política, e danos colaterais como os germes, passados ao homem pelos seus animais domésticos, e aos quais os euroasiáticos ganharam ao longo dos tempos imunidade. Essa mesma imunidade não foi adquirida pelos povos dos Novos Mundos que foram mais dizimados pelos germes que os seus conquistadores traziam nos seus corpos que pelas armas que traziam no porão dos seus navios.

Não deve hesitar em oferecer este livro a qualquer amigo racista de cabeça dura, pois se o seu conteúdo não o fizer ver que as diferenças culturais entre os povos, nomeadamente a dominação do mundo pelos povos euroasiáticos, não têm a sua razão de ser em diferenças biológicas e numa putativa superioridade rácica, mas antes em acasos e vicissitudes ambientais, geográficas e históricas que recuam aos primórdios da humanidade, talvez o peso das 490 páginas deixadas cair ?inadvertidamente? sobre a sua cabeça o faça.

TomaZ