Via da Verdade

Blog Português de Filosofia & Literatura mail: tiomas@yahoo.com

This page is powered by Blogger. Isn't yours?
terça-feira, junho 17, 2003
 
Chomsky, in Os verdadeiros pensadores do nosso tempo, de Guy Sorman

Em 1957 Chomsky propôs uma nova teoria da linguagem, em que nos diz basicamente que falamos como vemos.

Prova disso é que os linguistas verificam que, em todas as línguas, certas características são aprendidas e outras não. Estas características aprendidas são, portanto, herdadas genéticamente. Chomsky diz-nos então que não aprendemos a nossa língua, ela é inata, está inscrita na nossa biologia.
O que a revolução chomskyana pretende é que a linguística descubra as regras universais da linguagem, ou seja, as estruturas linguísticas comuns a todos os seres humanos.

A diversidade das línguas, diz-nos Chomsky, não é infinita: Não podemos afirmar nem pensar qualquer coisa. Todas as línguas assentam numa gramática universal única, e a estrutura das línguas que o homem é susceptível de falar é limitada, porque estamos limitados pelo nosso património genético.

A linguagem é, então, produto da nossa evolução natural e, como tal, estamos biologicamente limitados a combinar somente alguns tipos de sons e fazemo-lo segundo regras comuns a todas as línguas. Ex: muitas línguas formam o plural acrescentando à palavra um fonema suplementar. Em nenhuma acontece o contrário, ou seja, em nenhuma se retira um fonema para formar um plural.

A originalidade das línguas humanas está no facto de conseguirmos, com meios limitados, gerar um número infinito de combinações – Gramática Generativa.

Ao contrário de, por exemplo, Quine (ver Teoria da Indeterminação da Tradução, de Quine), Chomsky afirma que todas as línguas se podem traduzir e ser aprendidas. Isso prova a homogeneidade linguística da humanidade, que é uma consequência da nossa homogeneidade biológica.
Já uma hipotética comunicação com extraterrestres seria impossível, pois estaria condicionada pelas nossas naturezas distintas.
Ou seja: As estruturas de base do comportamento humano são sempre as mesmas, mas combinam-se de muitas maneiras diferentes, como um caleidoscópio. O mesmo se passa com as línguas.

Esta tese de Chomsky surgiu no década de 50 em concomitância com a descoberta do código genético: a origem da linguagem está nos nossos genes.
Como podemos ver, a filosofia linguistica de Chomsky é claramente cientifica, ou empírica.

Chomsky, e os investigadores do MIT, esforçam-se por encontrar, por detrás da diversidade aparente das línguas, uma unidade profunda: a Gramática Universal.

Segundo Chomsky as crianças já nascem a saber falar, da mesma forma que os pássaros sabem voar. Ou melhor, o adulto orienta a criança para falar uma determinada língua, mas a criança já possui em si, de um modo inato, as ferramentas para adaptar a linguagem à realidade. Ex: Quando uma criança aprende a dizer “uma pessoa”, descobre rapidamente o que é uma pessoa, mesmo que esta envelheça, ou lhe seja amputado um braço.
A capacidade de interpretar a realidade faz parte do nosso código genético. Além disso, logo que começa a falar, uma criança aplica espontaneamente regras de gramática muito complexas, que nunca ninguém lhe ensinou. Como tal, a linguagem decorre da biologia e não do ensino.


(0) comentários

domingo, junho 15, 2003
 
A teoria da Indeterminação da Tradução, in Enciclopédia de Termos Lógico-Filosóficos, ed. Gradiva

...manuais para traduzir uma linguagem noutra podem ser construídos de modo divergente, todos compatíveis com a totalidade das disposições verbais, mas, no entanto, incompatíveis entre si. W.V. Quine

De modo a estabelecer um manual de tradução entre duas línguas o linguista tem de estabelecer correlações semânticas hipotéticas entre palavras e expressões das duas línguas, de modo a formar um léxico e uma gramática para a linguagem alvo (a linguagem da qual se pretende traduzir as expressões é a linguagem fonte).

No entanto, este manual de tradução tem de obedecer a um “critério de correcção” que exige que haja uma adequação empírica entre as disposições verbais dos falantes da linguagem fonte (os nativos, no exemplo de Quine) e os termos da linguagem alvo, bem como uma maximização do acordo entre as crenças dos nativos e as do linguista, por forma a evitar situações de absurdidade e contra-senso.

O que Quine nos diz com esta teoria da Indeterminação da Tradução é que podem existir n manuais de tradução, todos eles correctos, e no entanto, todos incompatíveis entre si, isto porque cada um estaria de acordo com as disposições verbais (teia de crenças...) dos falantes nativos da linguagem fonte da tradução.

Esta teoria de Quine pretende refutar a tese do Mito do Museu da semântica mentalista, que diz que “as obras exibidas são os sentidos e as palavras são as legendas”. Ou seja, duas frases (uma na língua fonte, outra na língua alvo) expressariam (segundo o Mito do Museu da semântica mentalista) necessariamente o mesmo sentido: Gavagai e Coelho = Coelho.
Como tal, entre essas duas línguas, só uma tradução correcta e perfeita seria possível.

Quine mostra-nos que a realidade de uma teia de crenças (ou diferentes disposições verbais) é que é a responsável pelo sentido de uma frase, pelo que uma tradução perfeita nunca é possível.


(0) comentários

 
Leitura de Sobre o que há de W.V.Quine – as frases a negrito foram citadas na aula pela prof. Sofia Miguens.

O problema ontológico é formulável de uma forma muito simples (O que é que há?) mas permite um desacordo total acerca dos casos. Ou seja, a esta pergunta podemos responder de um modo muito vago: Há tudo!; ou podemos responder de um modo pragmático: Com que é que uma teoria ontológica nos compromete?

Afirmar que A e B diferem ontologicamente é afirmar que A defende que existe alguma coisa enquanto B defende que essa coisa não existe (ex. classes; números; mentes...)

O problema do proponente do lado negativo num diferendo ontológivo (x não existe) é o velho enigma platónico do não ser. Como é possível falar do que não existe?

O enigma platónico do não ser pode levar-nos (erradamente, segundo Quine) a reconhecer existência em casos em que poderíamos ficar satisfeitos reconhecendo que não há nada. (ex. “Falamos de Pégaso, logo Pégaso existe)

Uma hipótese acerca da existência de Pégaso é considerar que esta é uma existência enquanto ideia e não a existência de um particular espacio-temporal. Para Quine essa não é uma boa solução: basta comparar Pégaso com o Parténon. O Parténon real espacio-temporal é diferente da ideia de Parténon.

Uma alternativa, atribuída a Wyman, é a de considerar que Pégaso tem o seu ser como possível não realizado. Ou seja, ao afirmar “Pégaso não existe”, estamos apenas a afirmar que ele não tem o atributo particular de ser real. Wyman admite entidades possíveis, e faz uma distinção entre Existência e Subsistência.

De acordo com a perspeciva de Wyman, aquilo que “há” inclui possíveis e entre esses possíveis existem os realizados e os não realizados. Assim, devemos dizer que coisas reais existem mas muito mais coisas subsistem sem terem o atributo de existência.

Quine discorda da ontologia apresentada por Wyman. Quine basicamente acredita que num universo cheio de possíveis nem sequer é possível utilizar o conceito de identidade, e sem este conceito o nosso pensamento é impossível.

Faríamos melhor se simplesmente limpássemos a amálgama de Wyman e nos livrássemos dela. Pg. 24

É este o principio metodológico da ontologia de Quine. Entre a “Barba de
Platão” e a “Navalha de Ockam” Quine escolhe o minimalismo de Ockam, ou seja, a não proliferação de teorias e entidades desnecessárias.

Quine vai buscar à Teoria das Descrições Definidas de Russell a solução para o problema do excesso ontológico. O mérito da solução de Russell consiste no facto de ela evitar o compromisso com a existência de entidades nomeadas (Pégaso, cúpula quadrada-redonda do Berkley College...)
Russel mostrou como se pode usar nomes aparentes sem daí se supor que existam as entidades por ele nomeadas. Pg. 25

O passo de Russell para Quine: a carga da referência objectiva das linguagens é transferida dos nomes ou expressões descritivas para aquilo que os lógicos chamam de variáveis ligadas, ou de quantificação, que têm como análogo palavras como, algo, tudo, nada, e que são uma parte básica da linguagem, dotadas de sentido.

Ou seja, algo pode fazer sentido (meaningfull) e não ter sentido (meaning). I.e. algo pode fazer sentido sem com isso implicar que as nossas variáveis tenham uma realização, um sentido. Não é portanto necessária uma referência objectiva para que um termo faça sentido. Ao contrário do que pensa o hipotético filósofo McX, para quem Pégaso tem de alguma forma de existir, para que a palavra tenha sentido.

A proposta de Quine quanto a termos singulares é de que é sempre possível uma análise à maneira de Russell - ou seja: não é necessária uma referência objectiva para que um termo faça sentido. O problema mais difícil não são os termos singulares, mas os universais, que são mais resistentes a uma explicação nominalista.
Mesmo assim, graças a Russell já não precisamos de ser vítimas da ilusão de que o facto de que uma frase declarativa com um termo singular ter sentido pressupõe uma entidade nomeada pelo termo. Não é necessário que um termo singular nomeie para ter sentido. Pg. 28

O problema dos universais é o seguinte: será que existem entidades, tais como classes, números, funções, relações ou atributos? Note-se que sem estas entidades não é possível o conhecimento cientifico do mundo natural.

Posição nominalista de Quine acerca dos universais:
Quine pensa que é possível admitir que há rosas vermelhas, maçãs vermelhas, casas vermelhas, etc., sem admitir que essas rosas, maçãs e casas tenham algo em comum que subsiste por si (a vermelhidade).
Para Quine, o facto de rosas, maçãs e casas serem vermelhas é um facto último e irredutível.


Isso poderia levar-nos a declarar que os universais são sentidos, mas Quine pensa que os sentidos não são uma perspectivação real da natureza. A base da recusa Quineana dos universais é precisamente a recusa dos sentidos.

Isto não significa que Quine defenda que as palavras e as frases não têm sentido, significa apenas que Quine defende que não existem entidades abstractas a mais, paralelas ao comportamento linguístico dos seres humanos, que seriam os sentidos.


Como vimos, existe um hiato entre ter sentido e nomear. Não é necessário que algo exista, ou seja nomeado (objecto ou conceito abstracto) para que uma palavra tenha sentido. O sentido de uma palavra não é o objecto nomeado.
No exemplo de Quine, o hipotético filósofo McX insiste em atribuir ao sentido uma certa entidade abstracta. Quine defende que uma frase ou palavra pode ser significativa e não ter sentido (enquanto que se entenda por sentido uma qualquer entidade).
(McX) confundiu o alegado objecto nomeado Pégaso com o sentido da palavra Pégaso, concluindo assim que Pégaso tem que existir para que a palavra tenha sentido. Pg. 29

A ontologia de uma pessoa é básica relativamente ao esquema conceptual através do qual ela interpreta todas as experiências, mesmo as mais vulgares. (...) Julgada noutro esquema conceptual, uma frase declarativa que é axiomática para o espírito de alguém que se inscreva nessa ontologia (há o universal vermelhidão) pode, com igual imediatez e trivialidade, ser declarado como falso. Pg. 30


Os argumentos de Quine, até ao momento, foram:

1) Como demonstrou Bertrand Russell na sua Teoria das Descrições Definidas, os termos singulares podem ter significado (no sentido de serem significantes e não no sentido de possuírem eles mesmos um significado) sem se pressupor que existam as entidades que esses termos têm o propósito de nomear.
2) Podemos usar termos gerais, sem ser preciso admitir que eles sejam nomes de entidades abstractas (universais).
3) Aquilo que normalmente se chama “dar sentido a uma elocução” consiste simplesmente em empregar um sinónimo. Ou seja, não é necessário aceitarmos um domínio de entidades chamadas sentidos.

O problema dos universais, de nos comprometermos ou não nos comprometermos ontologicamente com as entidades abstractas que são os universais, é ultrapassado se na nossa teoria ontológica escolhermos comprometermo-nos com entidades (rosas vermelhas, maçãs vermelhas, casas vermelhas) mas não necessáriamente com entidades abstractas como a “vermelhidade”.

O problema dos universais é ultrapassado quando escolhemos uma ontologia de entidades abstractas. Ou seja, consideramos que quando nos referimos a entidades abstractas, fazemo-lo porque essa é simplesmente a nossa maneira de falar.

Uma teoria está comprometida com uma ontologia quando as variáveis dessa teoria se referem às entidades ontológicas de um modo tal que as afirmações feitas nessa teoria sejam verdadeiras. Muitos problemas filosóficos surgem devido a confusões acerca de qual o domínio de entidades às quais se deve permitir que as teorias se refiram.

Os medievais tiveram três abordagens ao problema dos universais: a realista, a conceptualista e a nominalista.
Abordagens que correspondem na filosofia do sec. XX, respectivamente à abordagem logicista, intuicionista e formalista.

O realismo é a doutrina dos universais platónicos (entidades abstractas que subsistem independentemente da consciência). Doutrina a que no sec. XX corresponde o Logicismo de Frege, Russell e Carnap.

O conceptualismo, da mesma forma que o intuicionismo actual, defende que há universais, mas que esses universais são produtos da nossa consciência.

Os formalistas, como os antigos nominalistas, objectam de todo a admissão de entidades abstractas, mesmo que produzidas pela consciência.

Ou seja, o género de ontologia que se adopta (realismo, conceptualismo, nominalismo, logicismo, intuicionismo, formalismo...) tem consequências nas teorias que caem debaixo do seu manto ontológico.

Mas como é que se pode decidir entre ontologias rivais?

Quando olhamos para uma teoria, que actua dentro de determinada ontologia, não procuramos saber o que é que há. Procuramos, antes, saber o que é que essa ontologia diz que há. Mas o que há, é outra questão.

A discussão acerca do que há deve ser tratada, antes de mais, ao nível semântico, pois uma vez que eu adira à minha ontologia não posso autorizar que as minhas teorias se refiram a entidades que pertençam a outra ontologia e não há minha. Posso no entanto discutir o desacordo entre duas ontologias.

Apesar de alguns desacordos básicos entre ontologias, há por vezes pontos de convergência em níveis mais superiores que possibilitam o diálogo. Enquanto for possível esclarecer linguisticamente ambas as posições ontológicas, o diálogo é desejável.

Como tal, uma controvérsia ontológica deve tender para uma controvérsia acerca da linguagem.

O que não quer dizer que o que há dependa de palavras, mas apenas que o que há é traduzível linguisticamente.

Então o que é que há?
Há aquilo que nos convém - em termos de simplicidade e operacionalidade – que haja.

Segundo Quine (ver pg. 36) adoptamos uma ontologia da mesma forma que adoptamos uma teoria cientifica. Adoptamos o esquema conceptual mais simples no qual os fragmentos desordenados da experiência em estado bruto possam ser ajustados e ordenados.

Quine chama a este método de adoptar uma ontologia, a “regra da simplicidade”.
A “regra da simplicidade” é, segundo Quine, a nossa máxima condutora ao fazermos corresponder dados sensíveis e objectos.

A seguir Quine apresenta-nos dois esquemas conceptuais (duas ontologias, portanto) distintas: o fisicalismo e o fenomenalismo.

Qual dos dois deve permanecer?
Cada um tem, à sua maneira, a sua simplicidade específica.
Um é epistemologicamente fundamental (fenomenalismo) enquanto que o outro é fisicamente fundamental (fisicalismo).

O fisicalismo é a tese de que o mundo real nada mais é que o mundo físico, como tal, simplifica a nossa explicação da experiência associando os inúmeros acontecimentos sensoriais a objectos únicos.
O fisicalismo contemporâneo considera que a física é o questionário básico (o mais básico) acerca da natureza. Como tal a ontologia tem de se virar para a física.

O fenomenalismo desenvolve a ideia segundo a qual os objectos são as possibilidades permanentes da percepção, e como tal não é de todo provável que cada frase acerca de objectos físicos possa ser traduzida na linguagem fenomenalista.

Os objectos físicos unificam e simplificam a nossa explicação do fluxo da experiência.

Quine procurou mostrar que alguns argumentos a favor de algumas ontologias são falaciosos. Além disso propôs um padrão um padrão explícito por meio do qual se decide quais os compromissos ontológicos de uma teoria.
No entanto, a questão acerca da ontologia que se deve adoptar permanece em aberto. Devemos manter, quanto a esta questão, um espírito crítico, tolerante e experimental.

É no entanto, diz-nos Quine, uma exigência natural seguir com a física. O que há, defende Quine, deve ser procurado pela física.

Por outro lado, para aqueles que decidiram adoptar um ponto de vista fenomenalista, que exige prioridade epistemológica, as ontologias fisicalistas não passam de mitos.
Todavia a qualidade do mito é relativa. Neste caso, relativa ao ponto de vista epistemológico, que é apenas um entre muitos, e ao qual corresponde um entre muitos dos nossos interesses e objectivos.


(0) comentários

sábado, junho 14, 2003
 
Ficha de Leitura de Philosophy of Language de W.Lycan

Cap. 8 – Verificacionismo; Dois desafios de Quine à
Filosofia da Linguagem dos Positivistas


Introdução

Segundo a Teoria Verificacionista, o significado de
uma expressão é a sua condição de verificacionalidade,
ou seja, o conjunto de experiências que demonstram que
essa expressão é verdadeira. Uma frase não verificável
pela experiência não tem sentido.

Objecções à Teoria Verificacionista do significado:
Duhem e Quine dizem que as frases, por si só, não têm
"condições de verificacionalidade".
Para Quine as frases não têm significado individual;
não existe algo como o significado de uma frase.
Ainda segundo Quine, não existem frases verdadeiras
por definição, ou analíticas.


A Teoria Verificacionista

– A Teoria Verificacionista como motor do positivismo
lógico

Um slogan positivista diz que uma expressão
linguística com significado deve influenciar alguma
coisa em concreto. Se não compreendermos uma
expressão, como poderemos afirmar que esta tem
sentido?

Os positivistas suspeitavam que muitas das obras dos
“grande filósofos mortos” não tinham qualquer sentido
e, muito menos, eram verdadeiras.
Uma frase era tida como “com sentido” apenas quando
havia a possibilidade de, através da experiência, se
demonstrar que essa frase era verdadeira. Os
positivistas chamavam a esta condição, “condição de
verificacionalidade”.

Ou seja, a Teoria Verificacionista identifica cada
significado de uma frase com a condição de
verificacionalidade dessa frase.
Uma frase que não passe a prova de fogo da
experiência, mesmo que gramaticalmente correcta, é
“sem sentido”.

Ainda segundo os positivistas, as frases analíticas
são, por definição, verdadeiras. Ou seja, não
necessitam de verificação empírica para terem
significado. O seu valor de verdade é garantido pelo
conjunto dos significados das palavras que as compõem.
Assim são as frases analíticas.

- Algumas objecções à Teoria Verificacionista

Segundo Wittgenstein, a Teoria Verificacionista era
apenas mais uma tentativa de se atingir a essência da
linguagem, além disso, esta teoria aplica-se apenas à
linguagem descritiva dos factos, que é apenas um dos
vários tipos de linguagens - fazer perguntas, dizer
poesia, dar ordens, entre outras.
É difícil perceber como é que a Teoria
Verificacionista poderá lidar com todos estes usos de
linguagem.
Uma resposta possível seria a de que os positivistas
se interessam apenas pelo sentido cognitivo da
linguagem. Mas neste caso o significado linguístico
fica sem uma teoria geral.

Na esteira de Duhem, Quine diz-nos que as frases, por
si só, não têm “condições de verificacionalidade.”
Esta só surge face a uma teia de crenças prévias. Ou
seja, mesmo na nossa linguagem quotidiana, aquilo que
pressupomos que seja uma clara “condição de
verificacionalidade” de certa afirmação empírica,
depende de uma grande teia de assunções auxiliares
(contexto, crenças, aparelho sensitivo, ambiente,
predisposições, etc.)
Uma “condição de verificacionalidade” tem de confiar
em todas estas assunções, e qualquer uma delas pode
falhar. Como tal, as frases não têm “condições de
verificacionalidade” intrínsecas.


Dois desafios de Quine à Filosofia da Linguagem dos
Positivistas


– Recusa da distinção analítico/sintético

Quine atacou a ideia de que algumas frases são
verdadeiras apenas em virtude daquilo que significam e
não devido a qualquer contribuição do mundo
extralinguístico.
Como os positivistas, Quine acredita que o significado
linguístico tem de ter um suporte epistémico, uma
âncora com a realidade, porém acredita que se o
significado linguístico é alguma coisa é uma função
desse suporte empírico.
No entanto – e aqui surge a proposta holista de Quine,
que o afasta dos positivistas – Quine afirma que o
significado das frases não se sustenta nas próprias
frases, mas num sistema holístico que é o suporte das
nossas crenças.
É neste complexo sistema de relações que se encontra o
sentido de uma frase. Para Quine, as frases não se
relacionam directamente com as coisas, mas
relacionam-se entre si dentro desta complexa teia de
crenças.

Ainda segundo Quine, nenhuma crença ou frase e nem
mesmo uma verdade lógica, é imune à revisão empírica
(uma lei lógica básica, como a regra do 3º excluído,
pode ser refutada por fenómenos quânticos). Uma frase
analítica seria imune a esta revisão, logo não existem
frases analíticas.
Algumas consequências da negação das frases analíticas
é a impossibilidade (a meu ver absurda) da existência
de frases sinónimas.

- A Tese da Indeterminação da Tradução

Para além de não existirem frases analíticas, Quine
diz agora que não existe “o significado”.
As frases não têm significado por si próprias. Se uma
frase tivesse significado, esse significado seria uma
“condição de verificacionalidade”. Como tal, as frases
não têm significado. – nota: aqui talvez seja aconselhável
acentuar que as frases não têm significado por si só, mas apenas
“ganham” esse significado num complexo sistema de
crenças. Ou seja, as frases não têm sentido
(meaningfull) mas podem fazer sentido (mean).
É neste sentido que a “tese da inescrutabilidade da
tradução” diz que uma tradução de uma língua para
outra nunca pode ser perfeita, pois cada frase não
significa por si própria, ou seja, não tem nenhuma
“condição de verificacionalidade”, e cada língua tem
“atrás de si” toda uma rede de conhecimentos, crenças,
etc., impossível de reproduzir noutra língua. Porém se
assim não fosse, se uma frase tivesse significado por
si só, uma tradução perfeita seria possível, uma que
conservasse o sentido real da frase. Como tal, diz-nos
Quine, as frases não têm significado. – nota: vimos
que para Quine não existe algo como "o significado" das
frases porque para haver esse significado as frases
teriam que se reportar a algum acontecimento concreto
no mundo extralinguístico (isto segundo a Teoria
Verificacionista, que Quine parece, neste ponto
essencial, aceitar). Isso, porém, não acontece, pois
as palavras e as frases vão buscar o seu significado a
um conjunto de crenças, a um sistema holístico. No
entanto resta a dúvida de porque é que Quine não
deixou cair o requisito verificacionista de uma
“condição de verificacionalidade” para a concessão de
significado.

Resumo

A Teoria Verificacionista diz que uma frase para ter
significado tem que ser verdadeira, ou seja, tem que
ser verificável empiricamente.

Duhem e Quine argumentaram que as frase não têm
“condições de verificacionalidade” próprias. Quine vai
mais longe e afirma que nenhuma frase é verdadeira
apenas em virtude do seu significado. Todas as frases
(mesmo as leis lógicas e matemáticas) são passíveis de
serem refutadas empiricamente. Como tal não existem
frases analíticas.

Ainda para Quine, as frases não têm significado (ou
seja, não têm “condições de verificacionalidade”
próprias). Não se relacionam directamente com as
coisas, mas são mediadas por uma rede de crenças.





(0) comentários

 
Ficha de Leitura de W.V.Quine, Filosofia e Linguagem, org. João Sáágua, ed. Asa.

Os Cinco Marcos do Empirismo

Neste ensaio é feita uma breve apresentação dos principais progressos feitos pela filosofia empirista, na qual se filia Quine. Na verdade, apesar de se dizer empirista Quine situa-se de uma forma crítica em relação ao empirismo clássico, como ficará patente neste ensaio.

Cinco pontos face aos quais o empirismo mudou para melhor:

1 – A primeira mudança operada em epistemologia foi a de se começar a falar sobre palavras ou expressões linguísticas em vez de ideias. Esta mudança de atenção das ideias para as palavras deveu-se a que a ideia não estaria à altura dos padrões do empirismo, que diz que apenas os sentidos fazem sentido.

2 – O segundo dos cinco pontos de viragem foi a mudança dos termos (palavras) para as frases, enquanto veículo do sentido. Este veículo do sentido deixa de ser visto como sendo a palavra, mas antes a frase.
Isto quer dizer que os termos significam apenas porque contribuem para o sentido das frases que os contêm. O primeiro filósofo a atribuir primazia à semântica das frases enquanto principal factor de obtenção de sentido, foi Bentham, seguido mais tarde por Frege e Russel (que na sua teoria das Descrições Definidas nos diz que os Nomes Próprios não são mais que Descrições Definidas disfarçadas).

Como consequência da mudança de atenção dos termos para as frases, a epistemologia tornou-se, no sec. XX, uma crítica menos dos conceitos que das verdades e das crenças.
Segundo Quine, a Teoria Verificacionista do sentido (ver Ficha de Leitura do Capítulo Verificacionismo in “Philosophy of Language” de W.Lycan – inserir data) dizia, de facto, respeito ao sentido e à posse de sentido das frases e não tanto das palavras.

3 – O terceiro movimento evolutivo do empirismo muda o foco de atenção das frases para o sistema de frases.
Uma frase seria um texto demasiado curto para servir de veículo para o sentido empírico. Existem numa teoria aquilo que Quine chama de condicionais observáveis, que dizem que se certas condições observáveis se verificarem um certo acontecimento observável ocorrerá. No entanto, estes condicionais observáveis seriam implicados apenas pela teoria como um todo.
A verificar-se este holismo radical, ou seja, a ser a teoria, ou todo o sistema de frases o veículo do sentido empírico, quão inclusiva teria de ser a visão dos sistema? A totalidade da Ciência? Apenas um dos seus ramos?
Segundo Quine, devemos encarar isto como uma questão de grau.
Bocados mais modestos serão suficientes. (...) Algum carácter vago quanto ao sentido deve ser permitido, aconteça o que acontecer.
Como tal, este terceiro movimento do empirismo deve ser encarado como um holismo moderado.
Haverá frases isoladas (...) que terão o seu sentido empírico separável, pois podemos tornar uma teoria numa frase única.

4 – O quarto movimento segue de perto este holismo. O holismo esbate o suposto contraste entre a frase sintáctica, com o seu conteúdo empírico, e frase analítica, com o seu conteúdo nulo.
As próprias frases analíticas encontram-se diluídas no sistema. Mesmo as leis matemáticas e lógicas são revizíveis e fazem parte de uma rede de crenças.

5 – O quinto movimento traz-nos o naturalismo: o abandono do objectivo de uma filosofia primeira, anterior à ciência natural. – nota: aqui importa aprofundar este 5º marco e fazer a passagem para a ontologia de Quine em “Sobre o que há”

O naturalismo vê a ciência natural como uma investigação sobre a realidade, sem necessitar de qualquer outra justificação para além da observação e do método hipotético-dedutivo.

O naturalismo não repudia a epistemologia mas delega-a à psicologia empírica: A questão do conhecimento é tratada pela psicologia empírica, reportando-se à aprendizagem da linguagem e à neurologia da percepção.

O filósofo naturalista procura melhorar, clarificar e compreender o sistema a partir de dentro. Como o cientista (e aqui podemos notar alguma sombra dos paradigmas de Thomas Kuhn), herdou uma teoria do mundo em plena actividade.
Ele – o filósofo naturalista – é um marinheiro ocupado, à deriva no barco de Neurath. Ou seja, no processo do conhecimento (assim como no da significação)não é possível largarmos a nossa bagagem de conhecimentos anteriores. – nota: neste ponto devemos estabelecer a ligação com a teoria quineana da Relatividade Ontológica, segundo a qual comprometemo-nos com determinadas entidades quando optamos por determinadas teorias ontológicas.



(0) comentários

quinta-feira, junho 12, 2003
 
Ficha de Leitura de “Performative Utterances” [Enunciações Performativas] de John L..Austin

Neste artigo Austin chama atenção para aquilo que chamamos de enunciações performativas, que são actos linguísticos onde é operado pelo sujeito um acto social convencional, mas onde nada é afirmado nem descrito.

Contra as Teorias Verificacionalistas (1) um filósofo wittgensteiniano considera que uma convenção social pode dar significado a uma qualquer expressão, sem que estas tenham nada a ver com a verificação ou com a verdade.

Austin começou por distinguir as enunciações performativas das enunciações descritivas (que referem situações, descrevem factos, etc...)
Ao exprimir-mos uma enunciação performativa estamos a desempenhar um acto social, estamos a fazer algo, e não apenas a dizer algo. Ex: Eu baptizo; Eu aposto; Eu prometo; etc. Deste tipo de enunciações não podemos dizer que são verdadeiras ou falsas.

Os actos de fala (ou actos linguísticos, discursivos...), como qualquer apologista de uma teoria do uso (2) nos diria, são actos convencionais. Ou seja, estão enraizados em práticas, costumes, tradições, etc.
Os actos de fala são regidos por muitos tipos de regras, normalmente implícitas no comportamento social.

Para uma enunciação ser performativa as palavras têm que ser ditas num determinado contexto. - J. Austin

Uma única expressão pode ter aspectos performativos e descritivos. A força ilocutória está no contexto de uma expressão e não apenas em alguma parte desta. Como tal, em diferentes contextos, a mesma frase pode ter diferentes forças ilocutórias. Ex: Vou-me embora! – é uma ameaça ou uma promessa?
A descrição de Austin entre frases performativas e frases descritivas evoluiu para uma distinção entre força e conteúdo enquanto aspectos de uma expressão.

Não há uma regra para todas as enunciações performativas.(...)
Afirmar ou descrever algo é tanto um acto como avisar ou ordenar (os actos performativos que temos vindo a falar).
- J. Austin

Diferentes forças ilocutórias dependem das intenções, objectivos, autoridade, etc., do falante - actos ilocutórios - e do ouvinte - actos perlocutórios (3).

Existem regras que regulam estes actos de fala, mas o valor de verdade de uma expressão não é o mais importante. A falsidade é apenas um de entre muitos outros motivos pelo qual uma expressão pode ser infeliz.

As Teorias Verificacionalistas do Significado identificam o significado de uma frase com o seu conteúdo proposicional. Mas não será a força ilocutória também um significado?
Alguns fenómenos semânticos apenas podem ser explicados através do recurso a factores ilocutórios.


(1) As Teorias Verificacionalistas dizem que o significado de uma expressão é a sua condição de verificacionalidade, ou seja, o conjunto de experiências que demonstram que essa expressão é verdadeira.

(2) Segundo uma Teoria do Uso o significado não é um objecto abstracto, mas antes o papel desempenhado por uma expressão no comportamento social humano. Como tal, saber o significado de uma expressão é simplesmente saber o uso correcto dessa expressão num determinado contexto.

(3) Acto Perlocutório - O acto linguístico praticado quando, ao proferir uma frase gramatical e com significado com uma certa força ilocutória associada, o falante de uma língua produz, além disso, efeitos específicos na audiência. - Enc.Term.Log.-Fil.


(0) comentários

quarta-feira, junho 04, 2003
 
Ficha de Leitura de “Language and Reality: An Introduction to the Philosophy of Language”
de Michael Devitt e Kim Sterelny, ed. Blackwell Publishers

Parte V; Capítulo 14 – Filosofia Primeira

Filosofia Naturalizada – A superação do problema dos universais

Os autores deste livro advogam um tipo de filosofia que não seja entendida como uma disciplina à priori, mas que esteja em continuação com a ciência. Uma filosofia naturalizada, portanto.
Devitte e Sterelny atribuem três papeis à filosofia:
- Servir de súmula aos conhecimentos dos ciências particulares.
- Interessar-se pelos problemas mais especulativos e conceptuais das ciências.
- Abordar áreas como a epistemologia, a lógica, a política, a ética, a estética, etc.

Uma abordagem naturalista da filosofia considera que certos problemas da filosofia tradicional não têm qualquer sentido, como por exemplo o problema dos universais.
A tradição filosófica identifica um universal como um atributo partilhado por vários particulares.
A crença num universal (por exemplo o universal vermelho) suscita algumas questões: O que é uim universal? Onde é que ele existe? Como se relacionam os particulares com os universais.

Um filósofo naturalista resolve este problema do seguinte modo: “Nada nos leva a dizer que existe algo como a vermelhidão. É suficiente dizer que existem coisas vermelhas.”
Qualquer resposta ao problema dos universais teria de vir da ciência (uma sensação neurológica partilhada por todos os seres humanos, uma molécula de cor vermelha, ou qualquer coisa do género). No entanto o filósofo naturalista não se contenta com uma explicação científica.

A favor de uma explicação científica em vez de uma explicação metafísica, o filósofo naturalista diz que, “não há mais nada para explicar (além daquilo que a ciência nos explica) e “não houve qualquer avanço metafísico desde Platão.” Tamanha incompetência da metafísica deverá levar-nos a concluir que os problemas metafísicos não são verdadeiramente problemas.
Para Devitt e Sterelny, a origem deste pseudo-problema está num mau uso da linguagem e numa incorrecata teoria do significado.
Os filósofos que incorrem neste pseudo-problema estão implicitamente comprometidos com uma teoris representacionalista do significado, que os autores chamam de “Teoria Fido-Fido”. Segundo esta teoria, o significado do nome “Fido” é o seu papel em nomear “Fido”.
No entanto, o erro está em se generalizar este exemplo em concreto (um nome nomeia uma pessoa ou um objecto) para todas as outras categorias de expressões linguísticas.
Por exemplo, a frase “Aquela rosa é vermelha” é composta por dois termos de categorias gramaticais diferentes (um termo singular, “Aquela rosa” e um termo geral, 2vermelha”). O que normalmente se passa é que os falantes de uma língua passam por cima destas diferenças essenciais e não vêm que dois tipos de termos nomeiam dois tipos de entidades. Esta confusão conceptual leva à crença, meio confusa, de que existe algo como “o vermelho”. A “Teoria Fido-Fido” é, como tal, falsa.
“O que nos confunde nas palavras é a sua aparente identidade quanto à forma, quando as ouvimos ditas ou as encontramos escritas ou impressas.” Investigações Filosóficas, prop. 11

A viragem para a linguagem - “The linguistic turn.”

Enquanto o filósofo naturalista aponta o dedo para a realidade, o filósofo linguísta discute o dedo.

A preocupação com a linguagem tornou-se, durante o século XX, primordial para a filosofia anglo-americana. Filósofos como Moore, Frege, Russell e Wittgenstein despertaram o interesse da filosófia pela linguagem, tomando esta (sobretudo para a filosofia analítica) o papel de Filosofia Primeira – Karl Otto Appel refere três paradigmas históricos da filosofia, ou seja, três temáticas principais da filosofia tradicional: o paradigma do ser, que ocupou a filosofia desde os Gregos até Descartes; o paradigma do conhecimento, em que se inscrevem Descartes, Kant, etc.; o paradigma da linguagem, que é o paradigma da filosofia actual.

Porquê esta viragem da filosofia para a linguagem?
Um dos factores preponderantes foi o descontentamento com os excessos metafísicos de grande parte da filosofía do século XIX. Uma maior atenção à linguagem impediria esses excessos.
Por outro lado, a filosofia não quis perder a carruagem da analiticidade e empiricidade das ciências.

Dentro do movimento do linguistic turn, os filósofos distinguiam-se pela maior ou menor importância que atribuiam à linguagem, sendo que alguns consideravam que a filosofia tenderia a diluir-se no estudo da linguagem.

Wittgenstein considerava que o estudo da linguagem acabaria por dissolver todos os problemas filosóficos – que na verdade não passavam de pseudo-problemas.
Para Wittgenstein a filosofia não se deverá preocupar com os problemas filosóficos genuinos da filosofia tradicional. Esses problemas, diz-nos wittgenstein surgem devido a confusões quanto ao uso das palavras.
Por isso a nossa investigação é uma investigação gramatical. E esta investigação ilumina o nosso problema por afastar uma possível má-compreensão. Uma má-compreensão que diz respeito o uso das palavras, provocada, entre outras coisas, por certas analogias entre formas de expressão em domínios diferentes da nossa linguagem. (Investigações Filosóficas – 90)

Aquilo que devemos fazer em filosofia é procurar libertarmo-nos destes problemas, prestando atenção à forma como usamos a linguagem. A filosofia não deverá procura ser uma sistematização de teorias e conhecimentos, mas antes um deixar cair dos problemas filosóficos tradicionais. Deverá ser uma cura, uma purificação do filósofo e não uma série de novos conhecimentos teóricos.

Os resultados da Filosofia são a descoberta da simples falta de sentido e das bolhas feitas pelo intelecto ao chocar com as fronteiras da linguagem. Elas, as bolhas, levam-nos a reconhecer o valor daquela descoberta.(I.F. – 119)

Umas das fontes principais da incompreensão reside no facto de não termos uma visão panorâmica do uso das nossas palavras. A nossa gramática não se deixa ver panoramicamente. (I.F. 122)

Um problema filosófico tem a seguinte forma: «Não me sei orientar» (I.F. 123)

Queremos impor uma ordem no nosso saber acerca do uso da linguagem, uma ordem para um certo fim uma de muitas ordens possíveis, não a ordem. (I.F. - 132)

Resumo

Os problemas filosóficos são pseudo-problemas que surgem devido ao mau uso da linguagem. O estudo da linguagem servirá para dissolver problemas e não para formular teorias.

Qual é a tua meta na Filosofia? Mostrar à mosca o caminho para sair do caça-moscas. (I.F. – 309)


Nota - Michael Devitt e Kim Sterelny não corroboram totalmente desta concepção wittgensteiniana de filosofia. Para eles a tarefa da filosofia é constructiva, apesar de haverem problemas filosóficos que são pseudo-problemas, como o problema dos universais, analisado atrás, que surge apenas devido a um “embruxamento” da linguagem.











(0) comentários

segunda-feira, junho 02, 2003
 
Wittgenstein n@ Net

-Biografia

-The Internet Encyclopedia of Philosophy
Ludwig Wittgenstein

-Wikipedia (tem bastantes links para temas e pensadores relacionados com Wittgenstein)

-Artigo de Daniel Dennett na Time

-Pensamiento y Acción:la Apuesta de Wittgenstein de Joaquín Jareño Alarcón

-Ludwig Wittgenstein na fUSION Anomaly



(0) comentários

 
Ficha de Leitura de "Philosophy of Language"
de William Lycan, ed. Routledge

Capítulo 6 – Teorias de “Uso”

O sentido wittgensteiniano de “uso”.

Por forma a compreendermos o termo significado no sentido wittgensteiniano devemos tomar o ponto de vista do receptor da expressão linguística, ou seja, daquele que procura compreender o sentido dessa expressão linguística.

Devemos perceber o fenómeno da compreensão como resultante da linguagem e de tudo aquilo que aprendemos, quando aprendemos a nossa linguagem.

Aquilo que aprendemos quando aprendemos uma linguagem é toda uma forma complicada de comportamento social. Aprendemos a interagir com as outras pessoas e com o mundo através de um complicado conjunto de regras que constituem a prática linguística.

As teorias essencialistas do significado não tinham em consideração a importância fundamental do uso na determinação do sentido. Segundo essas teorias, o sentido seria algo extático e inerte, algo de concreto com que as expressões linguísticas se relacionariam.

Wittgenstein refutou estas teorias, apesar de não negar que existam algumas relações desse tipo. A linguagem, diz-nos Wittgenstein, não é um conjunto de marcas ou sinais relacionados com certas entidades abstractas, as proposições. Para Wittgenstein a actividade linguística é, acima de tudo, um jogo.

A actividade linguística é algo que é governado por regras e convenções, maioritariamente intrínsecas, que passam despercebidas ao falante comum.

O uso correcto de uma expressão num determinado jogo de linguagem constitui o seu significado.As expressões que usamos têm papeis sociais funcionalmente definidos.
Existem, como tal, diversos jogos de linguagem: o matemático, o científico, de cortezia, de casamento, político, diplomático, etc.

Resumo

De acordo com as teorias do significado tradicionais, como a Teoria Referencial, a Teoria das Descrições Definidas de Russell, ou a Teoria das Proposições (que diz que algo tem significado quando expressa uma dada proposição), as frases e os termos linguísticos em geral são entidades abstractas cuja estrutura pode ser estudada como se de objectos reais se tratassem.
Wittgenstein recusa semelhantes conceitos de significado.
Para ele, o significado não é um objecto abstracto. O significado é o papel que uma expressão linguística desempenha no comportamento social dos seres humanos. Ou seja, saber o significado de uma expressão é, simplesmente, saber qual o uso correcto dessa expresão num determinado contexto.







(0) comentários

 
Jogos de Linguagem, in Enciclopédia de Termos Lógico-Filosóficos

Segundo a teoria wittgensteinianade jogos de linguagem, quando mudamos o contexto ou a prática associada a uma palavra, mudamos o significado dessa palavra.
A concepção agostiniana (ou denotativa) não funciona para todos os jogos de linguagem. Por exemplo: se num contexto específico a palavra lage significa um material de trabalho, noutro contexto qualquer pode significar outra coisa completamente distinta. O uso que se faz das palavras e o contexto a elas associado, são elementos constituintes da linguagem. Além do uso e do contexto existem outras duas noções cruciais associadas ao conceito de jogo de linguagem, a finalidade e a noção de seguir uma regra:

-Um termo, num certo jogo de linguagem, tem de ter um objectivo, uma finalidade, de modo a ser entendido.
-Jogos de linguagem diferentes seguem regras diferentes. Estas regras estabelecem-se implicitamente, através do uso.

A cultura, ou a forma de vida, constitui o pano de fundo da linguagem e dos diferentes jogos de linguagem.
Regras como a que regula o acto de apontar para objectos, ou a regra linguística geral que consiste em usar sons para nomear objectos, são como que o “leito rochoso” que constitui o fim do processo de análise conceptual da linguagem.

ver também: Actos de fala e Linguagem Privada


(0) comentários

domingo, junho 01, 2003
 
Leitura de “Wittgenstein”
de P.M.S.Hacker col. The Great Philosophers ed. Phoenix Paperback, Parte II

Nos Restantes capítulos do livro, Hacker demonstra como Wittgenstein procurou resolver alguns dos problemas tradicionais da filosofia.

No capítulo “Mente, corpo e comportamento: o poder da ilusão filosófica” é referida a forma como o dualismo cartesiano (a ideia de que o ser humano é constituido por duas substâncias distintas, mente e corpo) marcou significativamente toda a problemática filosófica das três centurias que se seguiram a Descartes. A desconstrução do Mito Cartesiano, que persiste subrepticiamente nos dias de hoje, tem de passar por uma análise cuidada de algumas características da nossa linguagem que ainda permanecem um pouco obscuras.

Nos capítulos “A posse privada da experiência” e “Privacidade Epistémica”, Hacker diz-nos que Wittgenstein considerava que a tendência da linguagem é, de uma forma gramaticalmente errada, procurar “apanhar” a essência das coisas, tanto no que toca aos objectos físicos, como em relação aos objectos mentais. Segundo Wittgenstein, a mente não é um palco, nem as ideias são protagonistas de uma peça que o sujeito, por introspecção, tem a capacidade de assistir.
Wittgenstein diz-nos que a palavra mente tem um significado, ou seja um uso, próprio na nossa linguagem. No entanto, importa clarificar esse uso que lhe damos, pois a ideia de um acesso directo e privilegiado aos nossos Estados Mentais não faz nenhum sentido.

O capítulo seguinte trata das diferença entre “Descrições e Expressões”. Segundo Wittgenstein, diz-nos Hacker, quando julgamos estar a descrever um estado interior, quando dizemos, eu penso que ou doi-me um dente, estamos simplesmente a manifestar (exprimir) linguísticamente o nosso comportamento natural, antecedente de qualquer jogo de linguagem.

Segundo esta concepção expressivista e naturalista de linguagem (por oposição à tradicional concepção descriptivista e cognitivista), as palavras estão ligadas à expressão primitiva da sensação e são usadas em seu lugar. “A expressão verbal substitui o choro, não o descreve.”

Ou seja, os nossos jogos de linguagem aprendidos, são antecedidos pelo nosso comportamento natural. As expressões verbais e as manifestações linguísticas surgem a partir dele.

Expressões como eu penso, ou eu acredito não são utilizadas (ao contrário do que normalmente se pensa) para descrever um estado interior que observamos dentro de nós, e que posteriormente comunicamos aos outros.
É este erro de concepção de um suposto acesso privilegiado ao nosso interior que nos leva a pensar que temos em relação aos outros um conhecimento apenas indirecto.
No fim do capítulo O interior e o exterior: o conhecimento dos outros, Haker cita uma frase de Wittgenstein nas Investigações Filosóficas que resume todo este capítulo: O corpo humano é a melhor imagem da alma humana .

Para Wittgenstein, os nossos conceitos de interior e exterior são metafóricos. Quando falamos, choramos ou gememos de dor, nós revelamos o nosso interior.
Ver alguém sofrer é saber directamente que essa pessoa sofre e a pessoa que sofre não tem conhecimento da dor (no sentido comum do termo conhecer), tem simplesmente dor.

Concebemos o interior e o exterior, o directo e o indirecto, porque interpretamos, erradamente, aquilo que vêmos como manifestações externas de eventos internos.
A ideia de que não apreendemos verdadeiramente (mas só de um modo indirecto) a alegria ou a tristeza na cara de alguém, está errada. Nós temos acesso directo à dor de outra pessoa porque ela nos manifesta essa dor. A pessoa que sente a dor também não “conhece” a dor que sente. Essa pessoa não nos descreve a sua dor, manifesta-nos a sua dor.
Ou seja, não faz sentido dizer que conhecemos os nossos estados interiores, no sentido comum em que conhecer é observar introespectivamente esses estados interiores de um ponto distante e privilegiado.

Como vimos, para Wittgenstein os nossos conceitos psicológicos estão logicamente ligados ao comportamento que o nosso interior manifesta. Mas como é que encontramos o significado das palavras?
No capítulo Mentes, corpos e comportamento, Hacker cita a proposição 357 da Investigações Filosóficas, onde se lê que quando se vê o comportamento de um ser vivo, vê-se a sua alma.Portanto, os predicados psicológicos são a extensão linguística do comportamento natural, da manifestação natural dos sentimentos e pensamentos.
Ou seja, nós não aprendemos as palavras identificando sentimentos ou ideias, como se de objectos interiores se tratassem, mas antes aprendemos as palavras através do seu uso enquanto extensões linguísticas do nosso comportamento natural.
Por exemplo: o significado de dor não é encontrado ao nomear um objecto interior, mas pelo uso de expressões que manifestam dor.

Wittgenstein rejeita a ideia de que as sensações, as percepções, os pensamentos, etc., têm de ser atribuidos ou a objectos físicos, ou a mentes ou almas.

O Mito Cartesiano persiste ainda hoje em discursos científicos que atribuem faculdades intelectuais a partes do corpo, nomeadamente ao cérebro.

Wittgesntein dir-nos-ia que o problema de saber se é ou não é o corpo que sente dor não é um problema empírico, mas antes um problema lógico ou conceptual. Nós não falamos de corpos que sofrem mas de pessoas que sofrem. E este modo de falar interfere com as nossas vidas. Este tipo de comportamento tem raizes pré-linguísticas em que se baseiam os jogos de linguagem.

Resumindo, não é o cérebro ou a mente que têm sentimentos, formulam questões, têm ideias, etc., mas antes o ser humano enquanto envolto num sofisticado comportamento linguístico.





(0) comentários